O ONDAS – Observatório Nacional pelo Direito à Água e ao Saneamento – é uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos, que tem por objetivo congregar e integrar, em âmbito nacional, entidades e pessoas físicas comprometidas com a defesa e a promoção dos direitos à água e ao saneamento.
A missão do ONDAS é defender o saneamento básico e o acesso à água como direito social e função do Estado na sua promoção. É também lutar pelo fortalecimento da prestação dos serviços públicos de saneamento, baseada nos princípios de solidariedade, equidade, universalidade, integralidade, com participação e controle social, combatendo todas as formas de discriminação, nas dimensões socioeconômica, de raça, gênero ou orientação sexual.
Em particular, nos preocupa a situação das Comunidades e Povos Tradicionais, mais especificamente a invisibilidade com que muitas vezes se dá a violação ao direito à água e ao saneamento nessas comunidades.
Os povos indígenas apresentam modos de vida específicos e os respectivos contextos socioambientais são determinantes para tornar suas demandas relacionadas à soberania alimentar, à água e ao manejo dos resíduos bastante variáveis. Os povos indígenas se consideram parte da natureza, não seus proprietários. Desde a chegada dos colonizadores encontram-se ameaçados pelo sistema econômico e expostos a ações desumanas, revestidas de impulsionadoras do desenvolvimento. Os desafios para implementação de políticas públicas que contemplem os povos indígenas são muitos, se relacionam à posse e usufruto exclusivo de suas terras e territórios, à saúde, à educação, à garantia do acesso à água com a proteção dos rios, ao reconhecimento e condições de trabalho adequadas dos profissionais de saúde indígena.
Neste sentido, a criação da Secretaria de Saúde Indígena (SESAI) em 2010 representou um avanço – uma conquista dos povos indígenas -, cuja atuação traz marcas importantes:
(i) reconhecimento do saneamento ambiental como um dos determinantes ambientais da saúde, expresso na própria estrutura da SESAI: Departamento de Projetos e Determinantes Ambientais da Saúde lndígena / Coordenação-Geral de infraestrutura e Saneamento para Saúde lndígena /Coordenação de Saúde Ambiental;
(ii) participação e controle social, por parte das populações indígenas na gestão das políticas de saúde a elas direcionadas – na implementação da Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos indígenas (PNASPI) e dos Planos Distritais de Saúde Indígena, em estreita articulação com os Conselhos Distritais de Saúde lndígena (CONDISI), com os Conselhos Locais de Saúde Indígena e, na base, com os Agentes lndígenas de Saúde (AIS) e os Agentes lndígenas de Saneamento (AISAN)
(iii) capilaridade, por intermédio dos Distritos Sanitários Especiais lndígenas (DSEI), que incluem em suas estruturas administrativas os Serviços de Edificações e Saneamento Ambiental lndígena (SESANI).
Tudo isso se viu facilitado pela centralização na SESAI das políticas e ações de saúde e saneamento em territórios indígenas, superando a pulverização e sobreposição anteriores, em que FUNASA e FUNAI dividiam responsabilidades sobre a atenção à saúde indígena. Em que pese os avanços, os desafios em relação ao saneamento nos territórios indígenas são muitos e diversos –mais de 300 etnias e 34 DSEIS. Estamos longe de ver respeitados vários dos princípios dos direitos humanos à água e ao saneamento estabelecidos pelas Nações Unidas: igualdade e não discriminação, participação, disponibilidade, qualidade e segurança, aceitabilidade. O drama dos Yanomani é apenas a face mais visível disso. Os anos de governo Bolsonaro foram particularmente cruéis para as populações indígenas. A eleição do Presidente Lula, a criação do Ministério dos Povos Indígenas e a nomeação de uma liderança indígena para conduzir a SESAI trouxeram alentos para as políticas de saúde indígena, incluindo o saneamento. Urge colocar em prática a recomendação do Programa Nacional de Saneamento Rural, de implementação de um “Programa Nacional de Saneamento Indígena”. Urge tornar realidade o Programa Nacional de Acesso à Água Potável em Terras Indígenas – PNATI.
A Medida Provisória nº 1.154/2023, que estabelece a organização básica dos órgãos da Presidência da República e dos Ministérios, ao atribuir ao Ministério das Cidades competências inerentes à Secretaria de Saúde lndígena (SESAI), constitui retrocesso, pois cria sobreposição de funções e coloca em risco vantagens associadas à SESAI aqui enunciadas: integralidade das ações de saúde indígena, indissociabilidade entre saúde e saneamento, capilaridade, participação e controle social por parte das populações indígenas na gestão das políticas de saúde.
Tudo isso posto, o ONDAS faz coro às recomendações ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva de veto ao inciso VII, da Seção III, Artigo 20 da MP 1.154/2023.
Todo apoio à Sesai, na promoção da saúde e do saneamento indígena.
Coordenação do ONDAS
14/06/2023
Importante defender a saúde dos povos indígenas, lugar da SESAI é no Ministério da Saúde