Há poucas semanas o IBGE apresentou os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PnadC) relativos o ano de 2019, onde se destaca, em época de pandemia, os 16,4 milhões de brasileiros sem água potável, dentre eles, 1,7 milhão residentes no estado de Minas Gerais. Os dados apresentados na pesquisa são escandalosos sob o ponto de vista sanitário e revelam verdadeiro atentado aos Direitos Humanos. Desde 2010 é direito inalienável do cidadão dispor de abastecimento de água e esgotamento sanitário.
Para não ficar apenas nisso, a Secretaria de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais anuncia, imediatamente após à publicação dos dados da PnadC, autorização para que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), contrate “serviços técnicos necessários à estruturação e implementação do processo de desestatização da COPASA MG”, leia-se privatização. A pergunta que fica é: Como assim? São quase dois milhões de mineiros sem água potável. Quem vai cuidar disto, se o governo do estado está prestes a abrir mão de seu único instrumento de política pública na área de saneamento?
O atual governador de Minas Gerais foi eleito com esse discurso privatista, e, portanto, não está enganando ninguém. Mas o que pode vir a representar essa privatização para a população mineira?
Vamos olhar a pretendida privatização da Copasa com a frieza dos dados: a empresa não depende do tesouro do estado; estudos feitos por bancos de investimento apontaram que eventual venda das ações da Copasa pelo governo mineiro geraria caixa de não mais de R$ 5 bilhões, valor que não seria capaz de pagar dois meses da folha de pessoal do funcionalismo público do estado; a empresa tem investido média de R$ 520 milhões/ano nos últimos 4 anos, o que gera impostos e empregos no estado, e colabora para movimentar a economia de Minas; a empresa tem apresentado lucro líquido anual crescente nos últimos anos, chegando a R$ 754,4 milhões em 2019, o que gera dividendos mínimos de R$ 190 milhões para os acionistas (o estado tem pouco mais de 50% das ações da companhia).
Será que, ainda assim, é vantajoso passar a companhia para o controle privado e deixar de poder fazer política pública para a população mais carente do estado? Acredito que o governo cometerá um de seus mais graves erros nesta administração.
Talvez a pandemia do covid-19 tenha vindo, entre outras coisas, para mostrar que a privatização e redução do papel do estado não é, nem nunca será, a solução para todos os nossos problemas.
É possível ter uma empresa estatal comprometida com a boa política, gestão efetiva e universalização do saneamento, para com toda a população, incluindo aquela mais desassistida pelo estado. Exemplos de empresas públicas de saneamento, na Bélgica, França e em outros países são soluções a serem observadas com atenção.
Elias Haddad Fillho – Engenheiro Sanitarista e associado do ONDAS