O Partido dos Trabalhadores (PT), como autor, e o ONDAS, na condição de amicus curiae, ingressaram no Supremo Tribunal Federal (STF), em 16 de julho, com Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental, questionando a lei que autorizou a privatização da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo.
Para as entidades, a lei sancionada em dezembro de 2023 pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), e os atos administrativos relacionados ao processo de privatização, violam a competitividade ao favorecer um único competidor na concorrência para ser o acionista de referência da companhia.
A ação tem pedido de liminar para a suspensão imediata da lei, ou seja, que seja barrada a continuidade do processo de desestatização da empresa de saneamento de São Paulo até o julgamento da ação. O processo foi distribuído por prevenção ao ministro Cristiano Zanin, que já é relator de ação sobre o tema. Contudo, há chances de o pedido de liminar ser analisado pelo presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, que atua no plantão durante o recesso do Judiciário, que vai até o final deste mês de julho.
A ação destaca que o processo de privatização “ocorre por meio de leilão com a participação de único concorrente com oferta significativamente abaixo do preço de mercado, em que adquirirá as ações por um valor de R$ 67 por ação”. A peça jurídica também ressalta que o preço mínimo de venda foi mantido sob sigilo e será divulgado somente após a venda das ações, no dia 22 de julho. “Ao não divulgar o valor mínimo e aceitar o preço ofertado afirmando como superior a esse mínimo, o governo estadual favoreceu inequivocamente o único competidor na disputa para ser acionista de referência e comandar a gestão da Sabesp”, afirma.
Ainda na ação é citada a cláusula sobre o “poison pill” (“pílula de veneno”) incluída nas regras. O governo determinou que, depois de a Sabesp ser privatizada, nenhum acionista majoritário poderá ter mais de 30% dos votos no conselho da empresa.
Para estabelecer esse teto, o Executivo definiu que, caso algum acionista ultrapasse 30% de participação, ele terá que estender a oferta para os demais acionistas com prêmio de 200% em relação ao valor originalmente ofertado, o que naturalmente reduz a chance de algum grupo se interessar.
“Poison pills” são instrumentos comuns do mercado, previstos no estatuto social das companhias, e servem para defender os demais investidores de um único acionista.
No caso da privatização da Sabesp, porém, as entidades afirmam que foi essa cláusula que levou à desistência da Aegea (uma das principais concorrentes) de apresentar uma proposta pela fatia da companhia. Isso abriu caminho para que a Equatorial fosse a única interessada na privatização, segundo a ação.
Outra regra adicionada no momento final da oferta de propostas para a escolha do acionista de referência também foi citada na ação. Trata-se do “right to match (“direito de igualar a proposta”, em tradução livre).
A regra permitia que o grupo com menor preço ponderado cobrisse a oferta do concorrente e saísse vencedor na disputa por acionista de referência – desde que tivesse o maior valor absoluto do book, ou seja, maior demanda dos investidores.
Para o advogado Rubens Naves, que assinou a ação como amicus curiae (terceira parte interessada) representando o ONDAS, a modelagem de privatização da Sabesp foi se adaptando aos interesses das pessoas envolvidas.
“Os outros grupos se afastaram porque era um processo que seguramente ia identificar um único vencedor, quer dizer, um único participante, e que acabou sendo o que ocorreu”, explica Naves, que cita também que há uma contaminação em todo o processo desde a contratação da consultoria IFC (International Finance Corporation), que analisou a viabilidade da privatização da Sabesp.
“Essa consultoria já assessorou o Ministério da Fazenda naquela época da discussão do marco legal de saneamento no Congresso Nacional. Essa mesma empresa vem discutindo a modelagem de privatização da Sabesp. Então são interesses muito consolidados, que inclusive afastaram outros concorrentes”, afirma o advogado.
Esta é a segunda ação ajuizada contra a privatização da companhia no STF. No último dia 15 de julho, o PT, Psol, Rede, PV e PCdoB questionaram a lei que autoriza a celebração de contratos de prestação de serviços de saneamento, o contrato de concessão firmado entre a prefeitura de São Paulo com a Sabesp e o cronograma de privatização da estatal. (com informações das agências de notícias)