Segundo dados do IBGE, cinco milhões de pessoas no Brasil não contam com banheiro em casa. Partindo do princípio de que o saneamento básico é um direito humano, o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio Grande do Sul (CAU/RS) idealizou o projeto “Nenhuma Casa sem Banheiro”, dentro do programa “Casa Saudável”. A meta é construir 11 mil banheiros em residência de famílias de baixa renda.
Confira a entrevista exclusiva com Roberta Krahe Edelweiss, Doutora em Arquitetura e Urbanismo, Conselheira do CAU/RS e Professora do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFSC.
ONDAS: Do que se trata o programa “Casa Saudável”?
Roberta Krahe Edelweiss: O projeto do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio Grande do Sul (CAU/RS) tem foco na saúde da família a partir da casa. A lei de ATHIS (Assistência Técnica para Habitação de Interesse Social) estabelece que todo cidadão tem direito à habitação. Devemos, então, observar não só o déficit habitacional, mas também a sub-habitação. Uma moradia digna precisa ter condições de habitabilidade e saúde mínimas, tais como ventilação, iluminação, ausência de umidade, entre outros.
Assim sendo, podemos estabelecer um paralelo entre o médico de família e o arquiteto de família. Como arquitetos, podemos tratar a casa e garantir um ambiente com condições de saúde básicas para a família inteira.
O programa, especificamente, visa a melhoria das habitações e consequente melhoria da saúde de populações mais vulneráveis.
ONDAS: Por que vocês sentiram a necessidade de, dentro desse programa, criar o desdobramento “Nenhuma Casa sem Banheiro”?
Roberta Krahe Edelweiss: A pandemia trouxe como recomendações lavar as mãos e ficar em casa. Tal recomendação acentua a vulnerabilidade de famílias de baixa renda em condições precárias de moradia. Muitas casas não têm as condições mínimas de habitabilidade. O saneamento básico é a sustentação para uma condição de higiene e um direito de todo cidadão.
O Nenhuma Casa sem Banheiro tem, portanto, foco específico no saneamento para famílias de baixa renda. O projeto conta com a participação do Governo do Estado, por meio das Secretarias de Obras e Habitação, Planejamento e Gestão e de Apoio aos Municípios; da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (FAMURS); do Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat) e com o apoio de outras instituições, como o Ministério Público Estadual e Federal, a Defensoria Pública e o Ministério Público de Contas, para citar algumas.
ONDAS: Qual a meta dessa iniciativa e como ela é viabilizada?
Roberta Krahe Edelweiss: Busca beneficiar 11 mil famílias em todo o Estado. Inicialmente, pretende atender 10 municípios da Região Metropolitana com a construção de 300 unidades. A iniciativa é viabilizada a partir da cooperação entre CAU/RS, prefeituras, entidades de arquitetura e urbanismo e arquitetos e urbanistas.
ONDAS: Como está o projeto no momento?
Roberta Krahe Edelweiss: Foi firmado convênio com a Secretaria de Obras e Habitação do Rio Grande do Sul. Em junho, o CAU/RS concluiu o credenciamento de entidades e profissionais de Arquitetura e Urbanismo que atuarão no projeto, na região Metropolitana de Porto Alegre. Oito municípios manifestaram interesse em participar.
ONDAS: A falta de banheiro atinge cerca de 1 bilhão de pessoas no mundo. Durante a pandemia, ficou evidente que uma parcela da população sequer tinha onde lavar as mãos. O programa trabalha esse viés do acesso ao saneamento como um direito humano fundamental?
Roberta Krahe Edelweiss: Justamente. Essa é a motivação do projeto!
ONDAS: Sabemos que a dificuldade de acesso à água e ao saneamento penaliza mais as mulheres e meninas, que acabam sendo as responsáveis pelos cuidados com a casa. Com a falta de banheiro, acontece o mesmo. Mulheres são expostas a problemas de saúde e até à violência sexual. Vocês perceberam isso durante esse trabalho?
Roberta Krahe Edelweiss: Muitas mulheres são responsáveis pelos cuidados da família e da casa. Além da responsabilidade, muitas mulheres são chefes de família. O aumento da violência doméstica contra a mulher durante a pandemia reforçou ainda mais a necessidade de atenção à equidade de gênero e, consequentemente, da priorização das mulheres.
ONDAS: Qual a mudança na vida de uma família a partir do momento em que passa a ter um banheiro dentro de casa?
Roberta Krahe Edelweiss: A mudança é a garantia de higiene e saúde. Com ela, a adoção de hábitos saudáveis, como tomar banho ou lavar as mãos, impactam positivamente na saúde física e mental de cada cidadão.