ONDAS – Observatório dos Direitos à Água e ao Saneamento

ONDAS - Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento

Nota do Grupo de Trabalho Água e Saneamento da Fiocruz sobre a água fornecida pelo sistema de abastecimento do Guandu

A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), instituição pública de ciência, tecnologia e inovação em saúde, vinculada ao Ministério da Saúde, vem atuando sob a perspectiva da água e do esgotamento sanitário como direitos humanos, de acordo com resoluções da ONU, desenvolvendo diversas ações com instituições nacionais e internacionais.

A experiência da Fiocruz na produção de estudos sobre os corpos hídricos, o esgotamento sanitário e seu impacto sobre a saúde pública, além do agravamento da crise hídrica, resultou na criação, em novembro de 2019, do Grupo de Trabalho Água e Saneamento, no âmbito da Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção de Saúde da Fiocruz.

O GT é composto por especialistas de diferentes unidades da instituição e vem atuando com o objetivo de subsidiar discussões, apoiar a produção de conhecimento que identifiquem soluções de saúde pública, promover a interlocução com governos, instituições e movimentos sociais nacionais e internacionais, visando propor e fortalecer políticas públicas em favor ao direito à água e saneamento, e induzir processos estratégicos na pesquisa, educação e cooperação relativos ao tema.

Tendo em vista os recentes acontecimentos relacionados à água fornecida pelo Sistema Guandu na Região Metropolitana do Rio de Janeiro pela Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (CEDAE), com base nos princípios de atuação da Fiocruz, destaca-se que:

  1. O acesso à água de qualidade e ao esgotamento sanitário são direitos humanos, reconhecidos pela Organização das Nações Unidas, com forte endosso do Brasil. Nesse sentido, qualquer retrocesso no acesso da população à água segura é considerado inaceitável;
  2. As alterações na qualidade da água distribuída no Rio de Janeiro e as recentes incertezas relativas são motivo de grande preocupação e requerem ações imediatas da prestadora de serviços, CEDAE, e das autoridades de saúde pública (vigilâncias municipais e estaduais). Em vista dos riscos, cabe a essas entidades comunicarem-se de forma clara com os usuários, orientando-os quanto à proteção de sua saúde. Cabe à concessionária aplicar medidas de precaução e garantir à população o uso de fonte de água que não a coloque em risco;
  3. A preservação e revitalização do Rio Guandu e seu entorno, principal manancial da Região Metropolitana do Estado do Rio de Janeiro, é imprescindível para o bom funcionamento de todo o sistema de abastecimento. Logo, é urgente a realização de ações para impedir a continuidade da contaminação por esgoto sanitário, efluentes industriais e resíduos sólidos dos rios Poços, Queimados e Ipiranga, que desembocam próximo ao ponto de captação da CEDAE no rio Guandu;
  4. A vulnerabilidade decorrente da contaminação observada nesses rios requer efetividade do plano de contingência do Sistema Guandu da CEDAE, que deve contemplar um protocolo de ações de controle de proliferação de microorganismos, algas e toxinas delas decorrentes;
  5. Na perspectiva do direito à informação e à saúde, é necessário que os órgãos responsáveis pelo monitoramento de qualidade da água forneçam à população informação atualizada e completa sobre a água distribuída e seus riscos, conforme determinam os artigos 13 e 44 da Portaria de Potabilidade de Água do Ministério da Saúde (Portaria de Consolidação no. 5/2017, anexo XX);
  6. Os fatos ocorridos demonstram a relevância e, consequentemente, a necessidade do fortalecimento da Vigilância em Saúde, componente essencial do Sistema Único de Saúde (SUS);
  7. É imprescindível a participação popular, que seja livre, ativa e significativa, na gestão dessa situação adversa em saúde pública coerentes com os princípios do SUS e dos direitos humanos;
  8. Há necessidade de investimento para universalização dos componentes do saneamento (sistema de abastecimento de água, esgotamento sanitário, manejo de resíduos sólidos e manejo de águas pluviais). Na região do estado do Rio de Janeiro onde ocorre fornecimento de água de forma intermitente, em descumprimento a Portaria citada no item 5, há riscos de contaminação da rede pública de água, portanto o mapeamento dessas áreas e ações corretivas pela concessionária são necessárias.
  9. É fundamental haver integração entre as ações da CEDAE, da Vigilância Sanitária Estadual e dos municípios atendidos pelo Sistema Guandu, quanto à avaliação, gestão e comunicação dos riscos, conforme responsabilidades estabelecidas na Portaria citada no item 5;
  10. Mediante solicitação do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro e por meio do Grupo de Atuação Especializada em Meio Ambiente (Gaema/MPRJ), a Fiocruz participou, em 13/01/2020, de vistoria à Estação de Tratamento do Rio Guandu. Participaram também da ação as equipes do Instituto Estadual do Ambiente (INEA), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), da Vigilância Sanitária do município e do estado do Rio de Janeiro e da própria Cedae. A partir dessa vistoria, o MPRJ encaminhou recomendação ministerial à Cedae, o que resultou na publicação dos resultados de monitoramento de água que estão agora disponíveis no site oficial da companhia.
  11. Foi realizada em 17 de janeiro de 2020 reunião convocada pelo MPRJ com a presença da Superintendência Estadual de Saúde do Rio de Janeiro e vigilâncias em saúde de municípios abastecidos pelo sistema Guandu onde a Fiocruz propôs a constituição de Grupo de Trabalho em Segurança da Água visando a articular os órgãos de saúde pública presentes sobre a qualidade da água do Rio de Janeiro.

A Fiocruz reconhece a urgência do esclarecimento dos fatos e da promoção de ações que permitam o retorno à normalidade do abastecimento de água para o consumo humano. Assim, continuará colaborando com os órgãos públicos responsáveis pelo monitoramento e controle da qualidade de água.

Grupo de Trabalho Água e Saneamento da Fiocruz

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