ONDAS – Observatório dos Direitos à Água e ao Saneamento

ONDAS – Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento

A luta das mulheres pelo direito à água: um bem comum que deve ser compartilhado

“A mulher e os direitos à água e ao saneamento” foi o tema da live realizada pelo ONDAS em 29/7, dando sequência a programação em comemoração aos 10 anos da declaração da ONU sobre os direitos humanos à água e ao saneamento. As convidadas para debater o tema, foram: Sônia Coelho: assistente social, integrante da SOF – Sempre Viva Organização Feminista e Marcha Mundial das Mulheres; Rosmari Barbosa Malheiros: secretária de Meio Ambiente da CONTAG e da Central dos (das) Trabalhadores (as) do Brasil (CTB); Elionice Conceição Sacramento: integrante da Articulação Nacional das Mulheres Pescadoras; e na mediação, Marília Melo, Diretora do Instituto Mineiro de Gestão das Águas – IGAM.

Marília Melo iniciou a live chamando à atenção sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável – ODS – da ONU, principalmente ao ODS 6.2. que traz reflexão importante do papel da mulher no acesso à água:
“6.2 –  Até 2030, alcançar o acesso a saneamento e higiene adequados e equitativos para todos, e acabar com a defecação a céu aberto, com especial atenção para as necessidades das mulheres e meninas e daqueles em situação de vulnerabilidade.”

Na sequência, Sonia Coelho contextualizou a divisão sexual do trabalho, na qual as mulheres acabam assumindo o papel de cuidadoras da casa e da família e, com isso, ficam responsáveis pela água dentro de seus lares. “No entanto, em um país como o nosso, onde há muita dificuldade de acesso a esse bem, fundamentalmente, para as mulheres mais pobres – das favelas, das periferias, na zona rural – há um sobrecarga de trabalho e tempo a essas mulheres”, explicou.

A integrante do SOF exemplifica com caso rotineiro na periferia da cidade de São Paulo, onde falta água durante o dia e chega às torneiras somente de madrugada, “daí são as mulheres que têm que ficar acordadas para encher as vasilhas, o tanque de água”.  Também na roça há uma sobrecarga de trabalho às mulheres, que têm que andar quilômetros para buscar água. “A mulher tem que levantar mais cedo que todos para dar conta dos afazeres domésticos, depois vai trabalhar na roça com o marido. Quando voltam, a mulher tem que preparar a comida e ainda buscar a água para o banho do marido”, enfatizou Sonia, que lembra ainda que a preocupação das mulheres não é só com a água para beber, cozinhar e fazer a higiene, mas também com água fundamental para produzir os alimentos.

A população em situação de rua também foi mencionada pela assistente social, citando que com a pandemia tudo ficou mais difícil. Ela lembra que sem comércio aberto, grande parte dessa população não tem nem onde conseguir água para tomar, quanto mais para fazer higiene pessoal. “Muitas vezes, a pessoa nem pode beber tanta água para não ir muito ao banheiro, porque não tem acesso”, explicou.

Para Sonia, frente a toda essa situação de falta de acesso à agua e ao esgotamento sanitário, ainda teve a aprovação do PL que privatiza a água, trazendo consequências graves para a população. Ele explanou sobre a importância do saneamento para a qualidade de vida, para a saúde, afirmando que “agora vão privatizar e entregar às transnacionais, que tratam a água como mera mercadoria”.

“Nossa grande luta hoje é: a água é um bem comum que deve ser compartilhado porque todas pessoas têm direito ao seu acesso”, afirmou.

“Quando perguntamos para as trabalhadoras rurais o que é água, a resposta é: água é vida”
A representante da Contag, Rosmari, enfatizou que o acesso à água é um tema desafiador para às mulheres tanto no campo como nas cidade, principalmente nas periferias, onde, praticamente, não se tem acesso a nenhum tipo de saneamento. “É um desafio, basta imaginar um dia sem água em uma casa.”

Sobre a importância da água na vida do campo, Rosmari exemplificou com a frase: “quando perguntamos para as trabalhadoras rurais o que é água, a resposta é: água é vida”.

Rosmari lembra que, muitas vezes, nas áreas rurais há disponibilidade de água, mas não é potável, e que essa é uma realidade cada vez mais frequente. Ela explica que, em vários assentamentos, os latifundiários tomam para si os rios e poluem a água com agrotóxicos e não há uma fiscalização, porque o atual governo desmantelou os órgãos ambientais.

A trabalhadora rural também falou sobre a privatização do saneamento em curso no país, que transforma água em mercadoria: “vira uma moeda de troca, deixa de ser um bem universal. Quem não pode pagar pelo serviço de saneamento, deixa de ter acesso”.

Para Rosmari, a água tem que estar associada a outras políticas públicas sociais, com renda mínima e saúde. “Nossa luta é para que o estado preserve a vida. É preciso se unir para barrar esse descaso que há com o povo brasileiro, principalmente, com o pobre”, afirmou.

Luta em defesa da água e contra sua privatização, na dimensão de água doce e salgada
Elionice conta que é de uma geração de mulheres das águas, pescadora e quilombola da cidade Conceição de Salinas (BA), e que a pesca é uma atividade sustentável e viável, praticada por homens e mulheres, mas que, infelizmente, as mulheres pescadoras não têm visibilidade.

Apesar de “invisíveis”, as mulheres pescadoras protagonizam, desde o ano de 2000, uma luta em defesa da água e contra sua privatização, na dimensão de água doce e salgada, quando se iniciou o projeto de parques em baías e o litoral, efetivamente, virou cobiça do capital.

Temos sofrido um ataque aos direitos dos povos tradicionais, aos direitos coletivos como a água. Para os pescadores, a água é um elemento fundamental da vida. É onde se cultua a ancestralidade e a espiritualidade”, explicou.

A representante das pescadoras explica que água para sua comunidade é um lugar de recreação, “é ambiente de lazer e onde vivemos grande parte da vida, sendo um território para nós”.

Elionice também falou sobre o tema do saneamento rural que, segunda ela, tem que ser pensado a partir das especificidades dos territórios. “Hoje o saneamento da cidade é lançado no rural. Vivenciamos esse problema em nossos territórios, com falta de tratamento de água, drenagem e coleta de lixo.” Ela explica que, muitas doenças são causadas não apenas pelo consumo de água sem tratamento, mas também pelo contato dos corpos dos trabalhadores com a água poluída, seja doce ou salgada, porque “nosso trabalho se dá nesse território da água”.

“Estamos na luta contra a privatização dos nossos territórios, pela justiça social e ambiental”, ressaltou Elionice.

live prosseguiu com a interação dos internautas e os debatedoras respondendo às perguntas.

➡ A íntegra da live também pode ser assistida no YouTube do ONDAS

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