O ONDAS junto de inúmeras outras entidades civis e sindicais e movimentos sociais, encabeçadas pela FENAE – Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal, assina manifesto contra a Medida Provisória 995/2020, que tem como objetivo privatizar a CEF – Caixa Econômica Federal, importante banco público de fomento de políticas públicas.
Editada no dia 7 de agosto pelo governo Bolsonaro, a MP permite a divisão da Caixa em várias empresas, por meio da criação de subsidiárias, que serão posteriormente vendidas sem autorização do Congresso e com prejuízo ao Estado e à população atendida. O fatiamento do banco deve prejudicar as operações que contribuem para o desenvolvimento regional, reduzindo as desigualdades.
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Manifesto contra MP 995/2020 que possibilita a privatização da Caixa
As entidades da sociedade civil abaixo vêm manifestar total discordância com a Medida Provisória 995/2020, publicada na noite da última sexta-feira (07/08) em edição extra do Diário Oficial da União, com o objetivo de desmembrar e privatizar a Caixa Econômica Federal. Em seus dois artigos, a medida autoriza o governo federal a passar por cima do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal para fatiar a Caixa em subsidiárias que poderão, posteriormente, ser tiradas do Estado e divididas com investidores.
Maior operadora das políticas públicas dirigidas à população brasileira, principalmente a parcela de menor renda, a Caixa é duramente atacada pelo governo federal justamente quando se mostra imprescindível para país e para o Estado. De acordo a MP, em seu artigo 2º, “tem por finalidade executar atividades compreendidas nos objetos sociais das subsidiárias da Caixa Econômica Federal, ou complementares a estes, e devem estar alinhadas ao plano de negócios de que trata a Lei nº 13.303, de 30 de junho de 2016, ou associadas a ações de desinvestimentos de ativos da Caixa Econômica Federal e de suas subsidiárias”. Este artigo frauda a Constituição Federal, que diz, em seu artigo 37, inciso 20, que “depende de autorização legislativa, em cada caso, a criação de subsidiárias das entidades mencionadas no inciso anterior, assim como a participação de qualquer delas em empresa privada”.
Ao Contrário do que dizem o Governo Federal e o presidente da Caixa, Pedro Guimarães, a privatização atinge diretamente o coração e a razão de existir do banco público, pois a medida alcança “os objetos sociais” das subsidiárias da Caixa.
Com esta atitude, o Executivo exorbita seu poder e desrespeita a Constituição, quando impede que a Medida passe pelo Congresso antes de produzir seus efeitos. A Medida Provisória precisa de avaliação do Congresso para se concretizar. No entanto, até correr o prazo de 120 dias para que perca a validade, a medida tem efeitos imediatos a partir da sua edição. Ou seja, não precisa de autorização legislativa para começar a valer.
A Medida provisória também tenta burlar uma decisão do Supremo Tribunal Federal, que decidiu, em junho de 2019, que a empresa-matriz não pode ser privatizada sem o crivo do Congresso. Mas os ministros entenderam que as subsidiárias das estatais não precisam de autorização e podem, inclusive, serem vendidas sem licitação. Como subterfúgio para burlar essa decisão, o governo tenta criar subsidiárias de atividades fundamentais à empresa-matriz, fatiando a estatal, e passa a vendê-las, diminuindo o tamanho da empresa-matriz.
A decisão do Supremo partiu de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.624, ajuizada pela Federação Nacional das Associações da Caixa Econômica Federal (Fenae) e pela Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf/CUT), em novembro de 2016, questionando a venda de estatais sem a permissão do Poder Legislativo.
Já prevendo a manobra do Governo, a Fenae e Contraf/CUT ingressaram, em dezembro de 2019, com embargos declaratórios para que fosse explicitado que o procedimento é inconstitucional. Estes instrumentos ainda não foram julgados. Portanto o Governo Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes, utilizam esta brecha para “passar a boiada” das privatizações, como anunciado na reunião ministerial de abril deste ano, amplamente divulgada pela mídia.
A escolha de adotar uma Medida Provisória deixa clara a intenção do Governo em atuar à revelia dos outros poderes para prevalecer sua agenda privatista. Por definição constitucional, Medida Provisória só pode ser editada quando prevalece a urgência e relevância. No entanto, o presidente da Caixa, Pedro Guimarães, já havia anunciado, ainda em 2019, que uma Medida Provisória com este conteúdo estava em análise pelo Executivo, portanto, não era urgente. Ao optar por este instrumento, o Governo atropelou o poder Legislativo para conferir ao Executivo a autorização de criar subsidiárias com o objetivo imediato de privatização. E de um modo geral e amplo, pois a medida não impõe limites e vale até dezembro de 2021 – 16 meses suficientes para dilapidar todo o patrimônio da Caixa, já que os efeitos da Medida serão irreversíveis, mesmo que não seja aprovada pelo Congresso.
A autorização é extremamente abrangente e permite que haja uma pulverização da atuação da Caixa por meio da criação de subsidiárias de vários níveis, impossibilitando o próprio controle da atuação do banco. O que enfraquece o papel social do banco público. A Medida contém apenas dois artigos, mas são devastadores para o banco que, há 159 anos constrói o seu patrimônio e sua história com olhar voltado à população. É assim desde as cadernetas de poupança para que os escravos conseguissem comprar suas cartas de alforria até o pagamento do auxílio emergencial para quase 65 milhões de brasileiros – ajudando o país a enfrentar a maior crise sanitária, social e economia dos últimos 100 anos.
A medida não vem para tornar a Caixa mais eficiente. Ao contrário, o que ela faz é abrir o caminho para que a Caixa seja “fatiada”, fique menor e perca espaço no mercado. Vender operações lucrativas do banco vai comprometer ação principal da Caixa, que é o seu papel social na área de habitação, crédito imobiliário, saneamento e tantas atividades que fazem da Caixa um banco público operador das principais políticas sociais do País, como o Programa Minha Casa Minha Vida e o Bolsa Família, para citar apenas alguns.
A iniciativa enfraquece banco e o desenvolvimento regional por ele induzido porque pretende privatizar justamente as áreas mais rentáveis da Caixa, que contribuem significativamente para a capilaridade do banco e seu efetivo papel social, seja no benefício aos mais carentes ou no financiamento da infraestrutura.
Até que ponto a Caixa será um banco público que seja capaz de cumprir seu papel social, se ela será desmembrada, fatiada, despida dos meios que dão capacidade financeira ao banco? Ao submeter a ação do banco ao mercado e à lógica do lucro, haverá interesse em financiar estes programas sociais? A atualidade pode responder a estas perguntas. Diante da pandemia foi apenas a Caixa, enquanto banco público, que auxiliou a população durante a, possivelmente, maior crise da história do Brasil.