Em contribuição ao debate do tema, a partir do artigo A norma brasileira de qualidade da água para consumo humano em revisão – um convite à reflexão sob a ótica dos direitos , de autoria do professor Rafael Kopschitz Xavier Bastos
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Alex M. S. Aguiar[1]
Encontra-se em processo de revisão a norma de potabilidade da água para consumo humano (Anexo XX da Portaria de Consolidação nº 05/2017 do Ministério da Saúde). A desigualdade socioeconômica do país, retratada pelo nosso déficit em saneamento, impõe que a elaboração de políticas públicas sempre observe a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que expressa o usufruto dos direitos a todos os seres humanos, sem distinções e sem exclusões de quaisquer ordens, e, particularmente, o direito humano fundamental de acesso à água e ao saneamento, cujo reconhecimento pela ONU em 2010 contou com a concordância de nosso país.
Uma modificação no âmbito da vigilância de responsabilidade dos municípios foi a exclusão do parágrafo único do Art.12º da norma vigente, que impedia a autoridade municipal de saúde pública, nos casos em que existiam rede de distribuição de água, de autorizar o fornecimento de água para consumo humano por meio de soluções alternativas, exceto em situação de emergência ou intermitência. Embora essa supressão elimine um aspecto excludente, ela não promove qualquer ação de inclusão que vá além das situações de emergência ou de intermitência. Assim, deveriam ser responsabilizados o operador do sistema e o município, titular dos serviços, pelo atendimento contínuo das parcelas da população desassistidas por rede de distribuição de água, por meio de Soluções Alternativas Coletivas de Abastecimento de Água (SAC). Dessa forma, a revisão da norma estaria promovendo o direito humano fundamental de acesso à água.
Ainda no tocante às ações de vigilância de responsabilidade da esfera municipal, foram detalhadas ações rotineiras a serem desenvolvidas, abrangendo inspeções sanitárias, avaliação do plano de amostragem, carregamento de dados no Siságua e outros. Considerando a variabilidade do porte e da estrutura disponível nos mais de cinco mil municípios brasileiros, é de se esperar que parte dessas atribuições não sejam cumpridas. Seria recomendável, portanto, que algumas delas fossem de competência conjunta com os órgãos responsáveis pela regulação dos serviços, como por exemplo as atividades descritas nos seguintes incisos do Art. 13º: II; IV; V; VI; VII; IX; X; e XIII.
Ressalta-se que o descrito no inciso XII do Art. 13º deveria ser expandido para os Quilombolas, Povos e Comunidades Tradicionais, e demais grupos vulneráveis indicados na Resolução nº13/2015 do Conselho Nacional de Direitos Humanos – CNDH/MDM[i]. O reconhecimento da condição de vulnerabilidade dessas parcelas da população torna necessário o estabelecimento de competência para seu atendimento adequado de água, ressaltando que a FUNASA[ii] tem responsabilidades adequadas a sua assunção: “… (A Funasa) é uma das instituições do Governo Federal responsável em promover a inclusão social por meio de ações de saneamento para prevenção e controle de doenças. É também a instituição responsável por formular e implementar ações de promoção e proteção à saúde relacionadas com as ações estabelecidas pelo Subsistema Nacional de Vigilância em Saúde Ambiental.”
Assim, sugerimos a adoção dos pontos acima descritos, como forma de ampliar a revisão dessa norma mediante a adoção de princípios compatíveis com o direito humano fundamental de acesso à água.
[1] Eng. Civil e Sanitarista (UFMG), MSc em saneamento (UFMG) – Foi diretor técnico da Copasa
[i] Ministério da Mulher, da Família, e dos Direitos Humanos. Disponível em https://www.gov.br/mdh/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-social/old/cndh/resolucoes/2015/dispoe-sobre-a-criacao-da-comissao-permanente-dos-direitos-dos-povos-indigenas
[ii] FUNASA. Disponível em http://www.funasa.gov.br/competencias
LEIA:
➡️ A norma brasileira de qualidade da água para consumo humano em revisão – um convite à reflexão sob a ótica dos direitos – Artigo Rafael Kopschitz Xavier Bastos
➡️ Apresentação: Revisão do Anexo Portaria de Consolidação nº 5/2017 (antiga Portaria nº 2914 / 2011), que trata dos procedimentos de Controle e de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano – um convite à reflexão sob a ótica dos direitos
CONTRIBUIÇÕES AO DEBATE
➡️ Revisão da Norma de Potabilidade: inclusões com vista aos direitos humanos – Alex M. S. Aguiar
➡️ Potabilidade: por um Anexo XX da Portaria mais inclusivo – Elias Haddad Filho
➡️ Fortalecer a vigilância da qualidade da água e melhorar a transparência sobre sua qualidade da água distribuída é contribuir para garantir o direito humano à água – Silvano Silvério da Costa
➡️ A portaria de potabilidade da água: insistência em avançar em meio ao retrocesso – Érika Martins
ONDAS faz balanço da proposta de revisão da portaria sobre água para consumo humano
Participe deste processo, faça aqui seus comentários e registre suas dúvidas e questionamentos. Em 20 de maio, o ONDAS promoverá uma “live” com o professor Rafael Bastos discutindo publicamente as contribuições. (acesso à live pelo Facebook do ONDAS: @ondas.observatorio.
Professor Rafael Bastos,
Sou Angela Cristina de Souza Cordeiro, tecnologista do Departamento de Saneamento e Saúde Ambiental da ENSP/Fiocruz. Gostaria que comentasse sobre a importância do controle de detergentes na água potável, sendo a concentração dos surfactantes (como LAS) limitada em 0,5 mg/L, na atual Portaria de Potabilidade, e sugestões de futuros trabalhos de pós-graduação sobre o tema detergente na água para abastecimento. Gostaria de receber seu comentário no meu e-mail, se possível. Sou sua fã.
Desde já, muito grata.