A aprovação da nova Lei do Saneamento pelo Congresso Nacional (14.026/2020) que prevê a privatização do setor, vai deixar as populações carentes em maior vulnerabilidade, com impacto direto na vida das mulheres que, pela divisão sexual do trabalho, são as provedoras de água para suas famílias. Essa é a visão geral de três lideranças femininas que debateram pela Internet, na última quarta-feira (29/07), o tema A mulher e os direitos à Água e ao Saneamento, realizado pelo Observatório Nacional pelo Direito à Água e ao Saneamento, ONDAS. O debate deu sequência aos 10 anos da declaração da ONU sobre os direitos humanos à água e ao saneamento.
Na abertura, a Diretora do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM), Marília Melo, que mediou o debate, afirmou que o papel da mulher é emblemático no provimento da água para suas famílias. Segundo a diretora, essa tarefa majoritariamente atribuída à mulher nos diferentes países, acaba por expô-las a sérios problemas de segurança e deixa também vulneráveis meninas em idade escolar que muitas vezes deixam de ir à escola para conseguir o provimento da água para suas casas. A falta de esgotamento sanitário é outra variável que atinge em cheio as mulheres, expostas à falta de privacidade e a precariedade de condições mínimas de higiene.
A primeira expositora, Sônia Coelho, assistente social, integrante da SOF – Sempre Viva Organização Feminista e Marcha Mundial das Mulheres, lembrou também que a água faz parte do cotidiano de todas as mulheres “num sistema patriarcal” que impõe a elas a responsabilidade de todo o trabalho doméstico. Neste contexto, ela foi enfática ao afirmar que as mulheres serão diretamente impactadas pela nova Lei do Saneamento. “Passaram a boiada”, disse ela, ao se referir à aprovação da Lei, enfatizando que o novo marco vai atender aos interesses de empresas transacionais como a Nestlé, a Ambev e a Coca Cola.
“A aprovação significa que a água está deixando de ser um bem comum, um direito de todos, para se transformar em mercadoria. Mas a privatização não é o fim, temos que continuar a luta para desprivatizar”, disse Sônia Coelho.
Rosmari Barbosa Malheiros, secretária de Meio Ambiente da CONTAG e da Central dos (das) Trabalhadores (as) do Brasil (CTB), lembrou que além da precariedade da água tratada e do esgotamento sanitário no campo, as populações rurais ainda convivem com a contaminação de mananciais pelo cobre e mercúrio “as pessoas estão morrendo envenenadas”, disse Rosmari. Ela também denunciou a privatização do saneamento e defendeu a tarifa social como direito das mulheres como chefes das famílias.
A última participante, Elionice Conceição Sacramento, integrante da Articulação Nacional das Mulheres Pescadoras, que teve parte de seu tempo de exposição de 15 minutos prejudicado por uma falha na comunicação da Internet conseguiu dar o seu recado. Disse que desde o ano 2000 as mulheres pescadoras consideradas “invisíveis” têm lutado pelas águas e contra a privatização. Falou sobre a cobiça do capital pelo litoral brasileiro e que a invisibilidade dos pescadores mostra um interesse econômico por trás dessa situação. Desde 2008, disse, não existem dados sobre pesca no Brasil. Elionice fez duras críticas à privatização do saneamento:
“Sem território livre e protegido a gente não conseguirá promover a justiça ambiental e social”. Segundo ela, os pescadores continuam em marcha não só na defesa da água doce, como em defesa das águas em geral. (Valderez Caetano)
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➡ A íntegra da live pode ser assistida no YouTube do ONDAS