ONDAS – Observatório dos Direitos à Água e ao Saneamento

ONDAS – Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento

MANIFESTO

As entidades abaixo assinadas vêm a público manifestar sua indignação e repúdio à negociação conduzida pelo Presidente da Empresa Baiana de Águas e Saneamento – Embasa e a Prefeitura Municipal de Salvador, relativa à prestação dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário na capital, que atenta contra os interesses da estatal e do povo baiano.

Em 26 de agosto de 1925, o Estado da Bahia e o Município do Salvador, assinaram Termo de Acordo em que o Município transferiu ao Estado a competência para a prestação dos serviços de água e esgoto. O citado Acordo, ratificado em 1929, reconhecido por Convênio de Cooperação entre Entes Federados de 2009 e novamente ratificado pela Lei Municipal 7.981/2011, ainda está em vigor. Recentemente, vieram à público informações sobre um processo de negociação em curso no qual foram identificadas possíveis ilegalidades que implicam em enorme insegurança jurídica e impõem ônus desnecessário para a Embasa. As condições da negociação estão materializadas numa minuta de um instrumento que visa a atualização do Acordo de 1925 em que constam como signatários o Município de Salvador e a Embasa, ambos sem legitimidade para tanto.

Ainda que as partes signatárias do Instrumento fossem legítimas, as condições econômico-financeiras da negociação poderiam configurar improbidade administrativa por danos ao erário, pois a minuta do Termo de Confissão e Compensação de Dívidas entre o município de Salvador e a Embasa tem um conteúdo repleto de dispositivos lesivos aos interesses da Embasa e que beneficiam indevidamente o Município de Salvador.

Em meio a propostas esdrúxulas para redução de débito e criação de crédito em favor do devedor, tem-se uma grande inversão do processo de negociação, com ausência das usuais práticas de encontro de contas e compensações mútuas. Algo sem precedentes em negociações desse tipo. Nada justifica uma negociação através da qual a dívida de 3,9 bilhões de reais que o Município de Salvador tem com a Embasa seja convertida num crédito de 500 milhões de reais em seu favor. Não é admissível que a Embasa jogue fora sua vantagem negocial de credor, virando devedor, sujeitando-se a condições leoninas impostas pelo devedor (Município de Salvador), que, por sua vez, passaria a ser o credor.

Não obstante a acertada decisão do Governador Jerônimo Rodrigues de suspender a citada negociação, trazemos a questão à baila novamente em razão da entrevista concedida ao Jornal À Tarde pelo atual Presidente da Embasa, publicada em 29 de janeiro de 2024, na qual o referido gestor reitera seu propósito de chegar a termo nas tratativas com a Prefeitura de Salvador, dando a entender que não houve mudança nas condições que vinham sendo negociadas anteriormente, em flagrante desrespeito ao Governador do Estado. É muito estranho e inusitado que o Presidente de uma empresa estatal deixe de cumprir as determinações do Governador do Estado.

Diante do exposto, reivindicamos a ratificação pelo Governo do Estado do fim da negociação em tela e a busca por alternativas para que a prestação de serviços da Embasa em Salvador seja dotada de segurança jurídica e regulatória e, de fato, contribua para a sustentabilidade econômico-financeira da empresa, evitando-se obrigações financeiras descabidas e danosas ao erário que o processo que estava em curso impunha.

As alternativas para a prestação de serviços pela Embasa em Salvador devem ser calcadas na prestação direta regionalizada, modalidade que se configura como uma tendência nacional e já é uma realidade em alguns estados do país (Paraíba, Paraná, Goiás e Rio Grande Norte) e está em fase de implementação em outros (Santa Catarina e Amazonas).  Em Goiás e no Paraná, as estatais de água e esgoto, SANEAGO e SANEPAR, tiveram, inclusive, uma elevação dos seus ratings pelas agências de classificação de risco Fitch Ratings e Moody’s, respectivamente, o que corrobora a segurança jurídica da modalidade.

Tais alternativas, portanto, são seguras juridicamente e capazes de garantir a captação dos recursos e a realização dos investimentos pela Embasa rumo à universalização dos serviços de água e esgoto no Estado da Bahia.

As entidades abaixo assinadas vêm a público expor, também, uma grande preocupação com a governança da Embasa.

O atual presidente da Empresa Baiana de Águas e Saneamento S/A – Embasa tomou posse em fevereiro de 2023 e desde então inúmeras denúncias foram feitas através de e-mail, redes sociais e pelo Sistema de Ouvidoria do Estado e da própria Embasa. Nunca um gestor da Embasa, e talvez do Estado, tenha sido objeto de tantas e tão variadas denúncias. As alegações vão de comportamento inadequado até atos ilegais, passando por acusações de improbidade, omissões e incompetência gerencial.

As denúncias chegaram ao conhecimento do corpo gerencial e funcional da Embasa, entidades do Estado, órgãos de controle, políticos, ONGs e Ministério Público, e não resultaram em nenhum posicionamento objetivo do titular da estatal em relação a nada do que fora denunciado.

Considerando o volume e a gravidade de tais denúncias, urge apurá-las, ainda que sejam anônimas. Algumas delas são de fácil verificação. E, diante da gravidade desse quadro, o recomendável seria o afastamento imediato do atual Presidente da Embasa, garantindo-se o seu direito de ampla defesa, para que não haja interferência direta ou indireta dele nas apurações, a exemplo da destituição irregular e injustificada do responsável pela auditoria interna da empresa que, no exercício de seu papel regimental, vinha apurando as denúncias.

Por fim, reiteramos, veementemente, nosso posicionamento contrário a qualquer forma de privatização dos serviços de água e esgoto, inclusive Parcerias Público-Privadas, bem como defendemos o fortalecimento da Embasa enquanto empresa pública e executora de uma política pública, como o Água para Todos, e o acesso à água e ao esgotamento sanitário como um Direito Humano a ser promovido pelo Estado, em conformidade com a Resolução A/RES/64/292 da ONU; e renovamos o nosso apelo e disposição para discutir com o Governo do Estado as propostas para a universalização dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, dentro dos princípios e diretrizes da Política Estadual de Saneamento Básico, instituída pela Lei Estadual nº 11.172, de 01 de Dezembro de 2008, bem como para a efetiva implementação de todos os seus instrumentos.

Salvador, 08 de março de 2024.

Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento – ONDAS (https://ondasbrasil.org/)

Observatório do Saneamento Básico da Bahia – OSB (http://osb-ba.org.br/)

Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental – Seção Bahia (http://www.abesba.org.br/)

Grupo Ambientalista da Bahia – GAMBÁ (https://www.gamba.org.br/)

Instituto Korango de Comunicação e Pesquisa Ambiental

Associação Baiana dos Profissionais de Saneamento Básico e Meio Ambiente – ABSAM

 

2 comentários em “MANIFESTO”

  1. Devemos nos unir ao Ondas e a todas as demais entidades na luta contra o desmantelamento dos serviços de água e esgotos na Bahia e no Brasil.

    A universalização desses serviços somente será possível com a parceria entre os diversos níveis de governo: municipal, estadual e federal.

    A privatização não é o caminho.

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