ONDAS – Observatório dos Direitos à Água e ao Saneamento

ONDAS – Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento

Quando uma empresa estatal garantiu água em Montes Claros

Alex M. S. Aguiar*

Em janeiro de 2017, a Diretoria Operacional Norte da COPASA, hoje extinta pela administração Zema, buscou apoio junto à Diretoria Técnica e de Expansão (DTE) da empresa para solucionar um grave problema de abastecimento de água na cidade de Montes Claros. Enfrentando um racionamento desde os fins de 2015, a cidade se deparava com um cenário de pouca precipitação no período chuvoso, incapaz de recuperar em níveis adequados o reservatório de Juramento, principal fonte de produção e responsável por uma vazão diária de 550 L/s para atendimento à demanda da população, então de 880 L/s.

A solução proposta pela DTE abrangeu: (a) a construção de uma captação no rio Verde Grande e junto à área da Estação de Tratamento de Água ETA Verde Grande, e cujo uso seria restrito apenas ao período chuvoso, haja vista a indisponibilidade de água deste manancial em outras épocas do ano; e (b) a captação de 350 L/s junto ao rio Pacuí, no município de Coração de Jesus, requerendo a implantação de 56 km de adução até a cidade de Montes Claros, de uso mais abrangente ao longo do ano.

A captação do rio Pacuí era uma alternativa oriunda de um estudo produzido pela DTE destinado ao aumento de oferta hídrica para atendimento ao consumo humano na região do semiárido mineiro e suas adjacências. Este estudo identificou 31 alternativas integradas, e que possibilitariam a universalização do abastecimento de água nessa região que historicamente sofre com a falta desse bem essencial.

Em março de 2017 foram realizadas as primeiras visitas de campo pelos engenheiros da COPASA que liderariam o empreendimento. Com a execução interna, abrangendo profissionais das áreas de projeto, meio ambiente, orçamentos, e com apoio de todas as demais áreas da Companhia, foram cumpridas todas as etapas requeridas para um empreendimento público: projeto básico, especificações, orçamentos, licenças ambientais e outorga de captação, licitação de obras e materiais. Tudo isso entre março e agosto de 2017. Em setembro foram iniciadas as obras, paralisadas pouco depois por intervenção do Ministério Público, que se posicionava contrário ao empreendimento, mesmo que esse se destinasse ao atendimento de quase 400 mil habitantes da mais importante cidade do Norte de Minas. Vencida essa contenda judicial, as obras foram retomadas em outubro, e em setembro de 2018, portanto 18 meses após a primeira visita a campo, a população de Montes Claros passou a receber mais de 300 L/s de água provenientes do Sistema Pacuí. Foram implantadas barragem de nível, três estações elevatórias, estação de tratamento de água, casa de química e unidade de tratamento de resíduos, dois reservatórios de compensação, e 56 km de adução, quase em sua totalidade apoiada em blocos sobre o terreno.

Durante esses 18 meses, foram enfrentados não apenas o posicionamento do MP, mas também de parte dos deputados estaduais, que se posicionavam contrários ao empreendimento – alguns simplesmente por se tratar de uma realização do Governo Pimentel, outros por defenderem outras alternativas também estudadas pela COPASA, mas que pelo prazo de execução não evitariam os riscos de agravamento da situação de baixa oferta de água – ; de prefeitos da região, que supunham serem prejudicados pela extração de água do rio Pacuí; e da mídia que insistia em criticar o empreendimento, dando voz àqueles opositores já citados.

Até hoje, o volume de água extraído do Sistema Pacuí correspondeu a 33% do volume do reservatório de Juramento. Isso significa que, sem a água proveniente do Pacuí, o reservatório hoje estaria seco, provocando o colapso do abastecimento de água da cidade. Também em outubro de 2020, um jornal da região – o mesmo que tanto criticou o empreendimento – veiculou matéria apontando o nível do reservatório como “o melhor dos últimos anos”, dizendo “estar afastada a hipótese de racionamento”, e reconhecendo que “a estratégia adotada pela estatal de fechar a barragem durante o período chuvoso, utilizando água de outros mananciais, permitiu esse equilíbrio.”

O empreendimento de trazer água do rio Pacuí para abastecer Montes Claros foi um exemplo do que uma empresa estatal pode realizar com eficiência, com competência de seu pessoal próprio, com modicidade de preços e absolutamente em favor da população a qual os serviços devem ser prestados. A todos da administração 2015-2019 da COPASA que se dedicaram a este empreendimento, fica o reconhecimento pelo excelente trabalho e pelo resultado em prol dos quase 400 mil cidadãos e cidadãs de Montes Claros.

*autor:
. Alex M. S. Aguiar – Engenheiro civil e sanitarista, mestre em saneamento pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), foi diretor técnico da Copasa. Atualmente é diretor da H&A Saneamento e membro e colaborador do ONDAS – Observatório Nacional do Direito à Água e ao Saneamento.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *