ONDAS – Observatório dos Direitos à Água e ao Saneamento

ONDAS – Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento

Para que e para quem serve a regulação do Saneamento Básico?

autor: Sergio Antonio Gonçalves *

Artigo publicado originalmente na Revista Sanear, edição 44, página 66.
A revista é editada pela Aesbe – Associação Brasileira das Empresas Estaduais de Saneamento

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Sergio Antonio Gonçalves – foto: Aesbe

No Brasil, em meados dos anos 1990, o governo federal introduziu suas teses que tratavam da presença do Estado na economia e seu tamanho ideal. Esta presença consolidou-se pela instituição da Lei 8.987/95, e foi um marco para o início das concessões e da regulação.

As primeiras experiências em regulação foram na área de energia elétrica (ANEEL), em 1996, e na área de telecomunicações, em 1997. No caso do saneamento, nessa década havia poucos reguladores, os quais foram criados quando alguns municípios optaram em conceder a prestação dos serviços para a iniciativa privada e tiveram que delegar ou criar órgão de regulação.

Para o setor de saneamento, as primeiras concessões em saneamento foram feitas nos municípios de Cachoeiro de Itapemirim/ES, realizada em 1998; os municípios de Armação dos Búzios, Cabo Frio, Iguaba Grande e São Pedro da Aldeia, localizados na região dos Lagos, no Rio de Janeiro, realizada em 1998; e o município de Manaus, em 2000, entre outros que se sucederam.

Com a Lei 11.445 em 2007, definitivamente a regulação foi trazida para o setor, o que considero um divisor de águas, pois se tornou obrigatória para qualquer prestador de serviços de saneamento básico e não apenas para aqueles concedidos à iniciativa privada.

Dentre algumas inovações trazidas pela lei, destaco a determinação da obrigatoriedade da regulação para dar validade aos contratos de programa ou de concessão.

Observando-se os dados históricos do Sistema de Informações em Saneamento (SNIS), vê-se que ocorreu um crescimento considerável na criação de agências reguladoras após a Lei de Saneamento de 2007. Atualmente, existem pouco mais de 50 agências reguladoras entre estaduais, regionais e municipais.

Alguns especialistas advogam que, em função desta grande quantidade de agências, há situações existentes em vários estados com normativos distintos e não padronizados para o mesmo prestador de serviços, gerando inseguranças técnicas e jurídicas, causando assim instabilidade na prestação dos serviços.

Com o tempo, observou-se que muitos reguladores não estavam preparados por não possuírem profissionais qualificados para o cumprimento das atividades. Lembrando que os componentes do saneamento básico não se restringem a água e esgotamento sanitário, mas também para resíduos sólidos e águas pluviais urbanas.

Na intenção amenizar possíveis conflitos no ano de 2020 com as alterações promovidas pela Lei nº 14.026, a regulação foi reafirmada e trouxe para a esfera federal o tema, por intermédio da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), que passou a ter a competência para instituir normas de referência para a regulação dos serviços públicos de saneamento básico, e como já era anteriormente, cabendo aos reguladores infranacionais a regulação propriamente dita. Passaram-se aproximadamente três anos desde a promulgação da Lei e o setor ainda se ressente de normas importantes.

Ampliando um pouco mais o debate de ideias e a função social da regulação, observa-se, ainda, que inúmeras agências não atuam para o cidadão. Isso é um vício de origem, no qual os reguladores tinham uma visão direcionada à regulação puramente econômica e contábil, enviesando a missão das agências reguladoras.

Posso inferir que, dentre outros fatores que interferem nas atividades de regulação, são as indicações políticas, sem a qualificação necessária para os cargos de direção, e a ausência da autonomia administrativa e financeira que enfraquecem a ação de Estado das agências.

Embora algumas agências tenham incorporado fatores sociais e de universalização dos serviços, tais avanços ainda são tímidos.

Segundo estudo que tratou dos “Aspectos conceituais da regulação dos serviços de água e esgoto no Brasil”, Galvão Junior e Paganini (2009), ao analisarem de forma comparativa a regulação do saneamento com a de outros setores da infraestrutura, concluíram que, em função das características físicas, econômicas e institucionais do setor de água e esgoto, seria bastante complexo o estabelecimento efetivo dessa atividade conforme os princípios da lei de saneamento.

Em janeiro de 2023, a lei de saneamento completou 15 anos e, em julho, a Lei nº 14.026 completará 3 anos e, ainda, temos muito a avançar como, também, avaliar os seus impactos sobre a regulação.

Assim, a regulação para o saneamento, dada as suas especificidades, que não são triviais, em se tratando de um serviço público de monopólio natural, continua sendo um desafio a ser enfrentado pelo setor.

Neste sentido, devem-se buscar novos aprendizados com o desenvolvimento de novas estratégias e métodos diferenciados daqueles tradicionalmente utilizados por outros setores, para que possamos alcançar os resultados favoráveis preconizados pelas diretrizes nacionais de saneamento.


*Sergio Antonio Gonçalves – Mestre em Saúde Pública na área de estudo da Gestão e Regulação dos Serviços Públicos de Saneamento (Fiocruz), engenheiro civil e bacharel em Química, secretário executivo da Aesbe.

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